Kierkegaard (lê-se Quirquigard), filósofo
dinamarquês e cristão ( 1813-1855), considerado por muitos como o precursor do
existencialismo, ao refletir sobre a existência humana acabou concluindo que a
verdade é a subjetividade e cada ser humano durante seu estar-no-mundo passa
por três estágios ou três possibilidades diferentes de existência. A saber, o
estágio estético, o ético e o religioso.
Quando o homem se
encontra no estágio estético, este vive para o ''aqui e agora'' e visa sempre o
prazer, acreditando que bom é aquilo que é belo e agradável. Tal pessoa vive
inteiramente no mundo dos sentidos e é extremamente focado na sensualidade e
acorda e dorme priorizando os apetites carnais. Interessa lhe o jogo da
sedução, sua existência é uma representação exclusivamente individual, não
considera os limites éticos e as obrigações sociais. O esteta além de não saber
discernir a diferença entre liberdade e libertinagem acaba virando joguete de
seus próprios prazeres e estados de ânimo: Tudo o que lhe aborrece que não
condiz com a sua concepção de moralidade é negativo e mesmo em situação caótica
que causa preocupação e sofrimento, este adota um comportamento de mero
observador. Responsabilidade e esforço não são o seu forte. Este busca um
sentido para a sua existência sob domínio de sentidos, sentimentos, impulsos,
prazer. Nesta fase, o indivíduo escolhe viver de aparências, vive uma vida
de“curtição”, se transforma num hedonista, aquele que busca o prazer a qualquer
custo e a toda hora sem limites.
O ser humano precisa
sentir prazer, imediato, não se preocupa com o futuro, e nem com grandes
projetos, tudo é presente. Busca simplesmente satisfação imediata, seja com
sexo, drogas ou rock'n'roll. Acredito que a maior parte das pessoas estão
estagnadas nesse estágio, desprezam que possuem um cérebro com capacidade para
pensar, e acabam por "adotar" um estilo de vida artificial, sem
aspirações intelectuais. Esse estágio também pode ser chamado de "Felicidade
Ignorante" (lembra da frase: "A ignorância é uma benção",
exatamente), ou seja, a pessoa tem todos os prazeres que quiser, mas essas
satisfações de curta duração só fazem aumentar o vazio que sentem por dentro.
Porém...vivendo de tal forma, o indivíduo não encontra satisfação, pois sua
existência passa a ser um círculo vicioso de busca pelo prazer seguido da
insatisfação. Sendo assim, com o tempo o
indivíduo torna-se frustrado, melancólico. A melancolia é oriunda de uma
personalidade focada no imediatismo e desprovida da reflexão ética. Tende a
refugiar-se no passado para encontrar satisfação, mas é em vão. Insatisfeito,
sujeito a sentimentos de medo e sensações de vazio e tédio, tende a cair no desespero.É a partir do
desespero que o homem pode atingir um outro estágio existencial. O desespero é
algo positivo para Kierkegaard, pois é por intermédio dele que o homem reflete
a possibilidade de dar o ''salto'' para um estágio superior.
O próximo estágio é o
ético. Atingido a partir do abandono dos comportamentos do estágio estético (
passa a se sentir responsável por suas ações). O homem passa a viver
eticamente, pautado na seriedade e por decisões consistentes, tomadas segundo
padrões morais. Aceita e obedece as regras, normas e convenções. Assume os limites
estabelecidos pela sociedade. Enquanto esteta se interessava apenas pelo que
era divertido, agora como indivíduo ético, não só considera o que é certo e
errado, mas, principalmente se posiciona em relação ao que é certo e errado. A
liberdade agora está limitada pelo social.
Kierkegaard afirma que o
casamento é um símbolo do estágio ético, pois é algo que é comumente aprovado
pela maioria das pessoas, independentemente de cultura, religião ou etnia. Uma
pessoa, a partir do momento em que se torna casada, assume diversos
compromissos - a fidelidade, o amor para com o cônjuge e para com os filhos, o
respeito para com os familiares, o dever de trabalhar para o sustento da prole
- estes compromissos são encarados como leis. Seria loucura quebrar algum destes
valores, a não ser em um caso extremo.
Contudo esse estágio não
garante a plenitude ao ser humano. Pode chegar-se o dia em que o homem zeloso
se cansa de ser tão organizado e moral e tão cônscio dos seus deveres e começa
a sentir tédio e fadiga em sua existência.
Aqui pode haver o regresso ao estágio estético, pois, talvez o homem
resolva tomar uma atitude mais lúdica diante da facticidade da existência. Ou,
talvez este resolva dar outro salto em busca do estágio religioso. O estádio
religioso para Kierkegaard é a pura vivência da Fé. O autor diz que o primeiro
estádio é só divertimento, o segundo é luta pela sobrevivência e o terceiro é
sofrimento por haver muitos riscos, mas que tipos de riscos? A vivência da Fé é
um risco por ser um salto sem certeza alguma, isso se perceber no trecho a
seguir. “Não há quem se detenha na Fé, hoje em dia – vai-se mais distante.
Passarei, certamente, por estúpido se eu for perguntar para onde esse caminho
se vai”. A vivência religiosa dá a consciência a cada individuo de sua
subjetividade, interioridade, e a singularidade. Então, é na Fé, que o ser
humano se descobre como ser humano.
''A Fé é a mais elevada
paixão de qualquer homem. Talvez exista muitos homens de cada geração que não a
atinjam, porém nenhuma vai mais além dela. Se se acham ou não muitos homens de
nosso tempo que não a encontram, não posso resolver isso, pois somente me é
permitida, a referência a mim mesmo, e não devo esconder que me resta ainda
muito por fazer, sem por esse motivo trair-me, ou trair a grandeza, reduzindo
isto a um problema sem importância, a uma doença infantil, da qual se espera
estar curado o mais rápido possível. Contudo, ainda aquele que não chega até a
Fé, a vida implica em suficientes encargos, e os aborda com sincero amor, a sua
existência não será em vão, ainda que não possa ser comparada à existência
daqueles que alcançaram e compreenderam o mais elevado. Contudo, aquele que
chegou até a Fé, e não importa nada que possua dons imanentes ou que seja uma
alma comum, esse não pára na Fé; ficaríamos até indignados se o disséssemos, da
mesma maneira que um amante se indignaria a escutar dizer que se detém no amor:
não me detenho, retrucaria, pelo fato de que toda a minha vida se acha jogada
aí. Não vai, entretanto, mais além, não passa a outra fase, porque assim que o
descobre outra relação o solicita''._KIERKEGAARD
Só no estágio religioso,
o homem após, preferir a Fé ao prazer estético e aos mandamentos da razão pode
reconciliar-se com sua própria vida. É somente através da religiosidade que o
indivíduo supera o desespero existencial de quem não visa algo mais para além
do plano social e terreno e entra em comunhão com o Ser Superior e a humanidade
e encontra satisfação existencial - não dá religião, da igreja, do culto, mas a
religiosidade individual do ser. Transcende os limites éticos. Faz relação com
o absoluto. Deus se trona a regra do indivíduo, a única fonte de realização
plena. Qual é a sua verdade: o caminhar para o Nada absoluto ou para um Plano
Superior? Em qual estágio você se encontra? Qual você prefere?
Por: Michel Gustavo de
Almeida
Nenhum comentário:
Postar um comentário