segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

KIERKEGAARD E OS TRÊS ESTÁGIOS DA EXISTÊNCIA HUMANA

 Kierkegaard (lê-se Quirquigard), filósofo dinamarquês e cristão ( 1813-1855), considerado por muitos como o precursor do existencialismo, ao refletir sobre a existência humana acabou concluindo que a verdade é a subjetividade e cada ser humano durante seu estar-no-mundo passa por três estágios ou três possibilidades diferentes de existência. A saber, o estágio estético, o ético e o religioso.

Quando o homem se encontra no estágio estético, este vive para o ''aqui e agora'' e visa sempre o prazer, acreditando que bom é aquilo que é belo e agradável. Tal pessoa vive inteiramente no mundo dos sentidos e é extremamente focado na sensualidade e acorda e dorme priorizando os apetites carnais. Interessa lhe o jogo da sedução, sua existência é uma representação exclusivamente individual, não considera os limites éticos e as obrigações sociais. O esteta além de não saber discernir a diferença entre liberdade e libertinagem acaba virando joguete de seus próprios prazeres e estados de ânimo: Tudo o que lhe aborrece que não condiz com a sua concepção de moralidade é negativo e mesmo em situação caótica que causa preocupação e sofrimento, este adota um comportamento de mero observador. Responsabilidade e esforço não são o seu forte. Este busca um sentido para a sua existência sob domínio de sentidos, sentimentos, impulsos, prazer. Nesta fase, o indivíduo escolhe viver de aparências, vive uma vida de“curtição”, se transforma num hedonista, aquele que busca o prazer a qualquer custo e a toda hora sem limites.
O ser humano precisa sentir prazer, imediato, não se preocupa com o futuro, e nem com grandes projetos, tudo é presente. Busca simplesmente satisfação imediata, seja com sexo, drogas ou rock'n'roll. Acredito que a maior parte das pessoas estão estagnadas nesse estágio, desprezam que possuem um cérebro com capacidade para pensar, e acabam por "adotar" um estilo de vida artificial, sem aspirações intelectuais. Esse estágio também pode ser chamado de "Felicidade Ignorante" (lembra da frase: "A ignorância é uma benção", exatamente), ou seja, a pessoa tem todos os prazeres que quiser, mas essas satisfações de curta duração só fazem aumentar o vazio que sentem por dentro. Porém...vivendo de tal forma, o indivíduo não encontra satisfação, pois sua existência passa a ser um círculo vicioso de busca pelo prazer seguido da insatisfação.  Sendo assim, com o tempo o indivíduo torna-se frustrado, melancólico. A melancolia é oriunda de uma personalidade focada no imediatismo e desprovida da reflexão ética. Tende a refugiar-se no passado para encontrar satisfação, mas é em vão. Insatisfeito, sujeito a sentimentos de medo e sensações de vazio e tédio,  tende a cair no desespero.É a partir do desespero que o homem pode atingir um outro estágio existencial. O desespero é algo positivo para Kierkegaard, pois é por intermédio dele que o homem reflete a possibilidade de dar o ''salto'' para um estágio superior.
O próximo estágio é o ético. Atingido a partir do abandono dos comportamentos do estágio estético ( passa a se sentir responsável por suas ações). O homem passa a viver eticamente, pautado na seriedade e por decisões consistentes, tomadas segundo padrões morais. Aceita e obedece as regras, normas e convenções. Assume os limites estabelecidos pela sociedade. Enquanto esteta se interessava apenas pelo que era divertido, agora como indivíduo ético, não só considera o que é certo e errado, mas, principalmente se posiciona em relação ao que é certo e errado. A liberdade agora está limitada pelo social.
Kierkegaard afirma que o casamento é um símbolo do estágio ético, pois é algo que é comumente aprovado pela maioria das pessoas, independentemente de cultura, religião ou etnia. Uma pessoa, a partir do momento em que se torna casada, assume diversos compromissos - a fidelidade, o amor para com o cônjuge e para com os filhos, o respeito para com os familiares, o dever de trabalhar para o sustento da prole - estes compromissos são encarados como leis. Seria loucura quebrar algum destes valores, a não ser em um caso extremo.

Contudo esse estágio não garante a plenitude ao ser humano. Pode chegar-se o dia em que o homem zeloso se cansa de ser tão organizado e moral e tão cônscio dos seus deveres e começa a sentir tédio e fadiga em sua existência.  Aqui pode haver o regresso ao estágio estético, pois, talvez o homem resolva tomar uma atitude mais lúdica diante da facticidade da existência. Ou, talvez este resolva dar outro salto em busca do estágio religioso. O estádio religioso para Kierkegaard é a pura vivência da Fé. O autor diz que o primeiro estádio é só divertimento, o segundo é luta pela sobrevivência e o terceiro é sofrimento por haver muitos riscos, mas que tipos de riscos? A vivência da Fé é um risco por ser um salto sem certeza alguma, isso se perceber no trecho a seguir. “Não há quem se detenha na Fé, hoje em dia – vai-se mais distante. Passarei, certamente, por estúpido se eu for perguntar para onde esse caminho se vai”. A vivência religiosa dá a consciência a cada individuo de sua subjetividade, interioridade, e a singularidade. Então, é na Fé, que o ser humano se descobre como ser humano.
''A Fé é a mais elevada paixão de qualquer homem. Talvez exista muitos homens de cada geração que não a atinjam, porém nenhuma vai mais além dela. Se se acham ou não muitos homens de nosso tempo que não a encontram, não posso resolver isso, pois somente me é permitida, a referência a mim mesmo, e não devo esconder que me resta ainda muito por fazer, sem por esse motivo trair-me, ou trair a grandeza, reduzindo isto a um problema sem importância, a uma doença infantil, da qual se espera estar curado o mais rápido possível. Contudo, ainda aquele que não chega até a Fé, a vida implica em suficientes encargos, e os aborda com sincero amor, a sua existência não será em vão, ainda que não possa ser comparada à existência daqueles que alcançaram e compreenderam o mais elevado. Contudo, aquele que chegou até a Fé, e não importa nada que possua dons imanentes ou que seja uma alma comum, esse não pára na Fé; ficaríamos até indignados se o disséssemos, da mesma maneira que um amante se indignaria a escutar dizer que se detém no amor: não me detenho, retrucaria, pelo fato de que toda a minha vida se acha jogada aí. Não vai, entretanto, mais além, não passa a outra fase, porque assim que o descobre outra relação o solicita''._KIERKEGAARD

Só no estágio religioso, o homem após, preferir a Fé ao prazer estético e aos mandamentos da razão pode reconciliar-se com sua própria vida. É somente através da religiosidade que o indivíduo supera o desespero existencial de quem não visa algo mais para além do plano social e terreno e entra em comunhão com o Ser Superior e a humanidade e encontra satisfação existencial - não dá religião, da igreja, do culto, mas a religiosidade individual do ser. Transcende os limites éticos. Faz relação com o absoluto. Deus se trona a regra do indivíduo, a única fonte de realização plena. Qual é a sua verdade: o caminhar para o Nada absoluto ou para um Plano Superior? Em qual estágio você se encontra? Qual você prefere?
 
Por: Michel Gustavo de Almeida



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