domingo, 14 de setembro de 2014

IPÊ AMARELO



Ipê amarelo
que ocupas exíguo
espaço de terra;
espigões de cimento
buscam o céu a tua
volta; por cima
do muro exibes
a tua copa dourada;
homens de preto,
sérios, tensos,
preocupados
vigiam a segurança
de milhares de seres
humanos engaiolados.
Transitam adultos
cabisbaixos, deprimidos,
nervosos, envolvidos
com os seus problemas;
correm crianças alegres,
felizes, despreocupadas;
bando de jovens saem
das aulas monótonas
e cansativas, buscando
na gritaria ensurdecedora,
a liberdade aprisionada;
idosos passam atentos
ao chão para não caírem;
cães atrelados, impacientes
puxam os seus donos;
um bêbado apoia-se
na parede, sem rumo,
invisível. Tua copa brilha
ao sol de um novo dia.
Derramas na calçada
um tapete dourado;
um homo sapiens
se aproxima de ti,
varre teu tapete, irritado
pela sujeira que fizeste.
Agora tuas flores
vão enfeitar o lixo
da cidade, insensível,
brutal selva de pedra.
Tu continuas o mesmo
cumprindo a tua missão,
oferecendo beleza
para quem tem
olhos para enxergar!
 
Lucila Peres Jordão
 
Comentário: toda poesia, geralmente se vincula ao belo, ao sublime, capaz de tocar com profunda sensibilidade os corações que precisam do conforto espiritual. O fenômeno do fazer lírico poético é próprio para alegrar corações entristecidos e edificar almas desoladas. A beleza da poesia, desse modo, reside na tradição de valorização dos bons sentimentos, que devem ser absorvidos espontaneamente, no íntimo das almas aprendizes que almejam a edificação de suas consciências em contínuo processo evolutivo.Mas no fazer poético (diante de um mundo ainda com tantas anomalias morais, com tantas desigualdades sociais, com tantos desequilíbrios ambientais, com tanta incompreensão, desamor e desrespeito à própria vida e à vida do próximo), pode-se também inspirar-se para compor uma literatura poética a partir da observação da dura realidade social em que vivemos. E todo poeta, senhor do seu ofício, tem também que ser sensível o suficiente, para cantar não só, as belezas que existem em seu interior artístico, ou que o cercam, mas também cantar as adversidades existenciais e naturais do mundo que vivencia a sua evolução transitiva, no sentido do exercício do senso crítico literário, para que o leitor desatento, insensível, e alheio à melhoria do seu próprio bem-estar e das coisas que o cercam, possa despertar ao seu indispensável aprimoramento consciencial em convivência fraterna com o próximo, buscando também a unidade harmonica de ambiência com os elementos urbanos e rurais, possibilitando um melhor equilíbrio entre o homeme o seu semelhante, entre o homem e a natureza, entre o homem e Deus. E é nesse contexto de dualidade de nossa realidade existencial, que surge a poesia social genuína da poetisa Lucila Peres Jordão, engajada, militante, alarmante, denunciante das mazelas sentidas por um mundo que caminha com passos firmes para sair de sua condição de expiação e provas, para um mundo de renovada regeneração moral. Vale acrescer aqui que, mesmo ocupando-se em construir uma poesia mais vinculada à dura realidade do nosso tempo, nem por isso, o seu fazer poético deixa de ser belo, lírico, sublime, visto que, o talento artístico que ressalta de sua alma sensível, provém de sua índole introspectiva, mediante a sua espiritualização, buscando entender-se, conhecer-se a si, para depois entender, conhecer o mundo, as coisas que a cercam, visando melhorar-se moralmente a partir de sua elevação interior, semeando-a em interação fraterna com o seu próximo.
Parabéns, poetisa!
Adilson Fontoura


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